quarta-feira, 31 de outubro de 2012

Senhora ausência

A gente só demora a entender (se é que entende um dia), amigo Drummond, que a ausência é a prova mais absoluta da presença. Se não fosse, ela, a ausência, não haveria. Não seria notada. Seria como viver anestesiado, com os sentidos afastados. Não é isso que ela provoca. A ausência não permite não ser notada. Pelo contrário, é forte em se fazer presente. É muito mais forte que o nada. Não há quem a despiste. Não há quem a engane. A ausência é força maior que a própria presença. Quase sempre.

segunda-feira, 29 de outubro de 2012

Parece aborto

Tenho dois casais de amigos que tiveram a sorte na vida de nunca terem passado por separações. Só pode ser sorte. Conversamos sobre isso outro dia. Eles não sabem bem o que é ter alguém num dia, participando da sua vida, sendo seu cúmplice, seu melhor amigo, seu amante, seu companheiro, seu tudo, e não ter esse alguém no outro dia. É uma sensação muito esquisita. Parece que tudo é fake, que as coisas não existiram. Pelo menos não existiram assim. Como se, na sua cabeça, existisse algo muito rico, forte, consolidado, só que, na verdade, não é assim.
Não existe nada consolidado. Não existe nada tão real assim. Me rendendo ao clichê, lembro Marx, com a famosa frase "tudo o que é sólido desmancha no ar", claro que se referindo a outro contexto, no "Manifesto comunista", mas tão bem aplicado em tantas outras situações, inclusive, nos relacionamentos.
Tentando me colocar no lugar de alguém que nunca passou por isso para imaginar como é, eu comparo a separação com uma situação pela qual eu nunca passei, mas que também deve ser dolorida (quando não é provocada), o aborto. Acho que a separação é como um aborto. É aquela ruptura de uma vez, abrupta, inesperada, que mata, arranca de você uma coisa que você amava muito e que não tem como você fazer voltar. Acho que as duas sensações se parecem. Porque você é obrigado a se separar de algo valioso para você, mas não quer se separar dessa coisa. Tem que... Tem que... Tem que... Sem querer. É corte feito entre duas vidas. O corte do cordão umbilical entre mãe e bebê. É tudo sofrido.
Falei com esses dois casais que eles só podem ser pessoas muito abençoadas por não terem passado pela experiência da separação. E não é argumento dizer que eles têm menos experiência nesse campo. Acho o contrário, têm outro tipo de experiência, que é a de não se separar. Aliás, uma experiência rara entre nós, ainda mais na atualidade. Separação pode ser aprendizado. Mas é dolorido.É traumático. É difícil de superar.
Talvez a maior marca, a mais cruel marca, que a separação deixa é o medo da união. É o medo que ela te deixa de se unir a outro novamente. Para que unir de novo se vou me separar mais na frente? Esse medo vai ficando até que algo ou alguém muito impactante atravesse seu caminho de novo. Aí, já era! Volto ao recurso da citação, agora a João Bosco: "O amor quando acontece/ A gente esquece logo/ Que sofreu um dia". E não é assim? Oxalá!