sexta-feira, 4 de julho de 2014

Viaduto no caminho da vida

Andei bisbilhotando seu Facebook. Jornalista tem dessas coisas. Até te peço desculpa, mas imagino que o que você deixou lá era para ser visto. Senti que você era uma pessoa que não tinha muita vergonha da vida, de curtir com seus amigos. Até soube que você gostava muito, muito de dançar. Axé e pagode, acho. E hoje, hein? Era dia de ir para a Fan Fest, comemorar a vitória do Brasil (ufa!) contra a Colômbia. É, estamos na semifinal, com muito custo. Joguinho suado, disputado, faltoso, encrenca. Enfim, estamos.
É motivo de alegria.
Seria. Não, não é motivo de alegria, não como deveria ser. A seleção não tem culpa de nada, o futebol, os jogadores. A gente sabe das coisas ruins que rolam por trás, o que não vai fazer com que a gente perca uma paixão que vem com a gente de berço, um dos motivos de nos mobilizarmos tanto e chorarmos de alegria e de tristeza. O futebol não tem nada com isso. Nem a Copa.
Quem tem a ver com isso, com a sua ausência nessa comemoração é gente que não liga para ninguém. São essas pessoas que querem só uma coisa: dinheiro. Meu Deus! Mas já não têm o bastante? Têm, mas sempre querem mais. Mas precisam colocar o dinheiro acima de tudo? De outras pessoas, gente inocente, que trabalha, vive, leva a filha de 5 anos para o trabalho quando ela está de férias. De gente que, exatamente agora, queria estar dançando, tomando uma cervejinha, abraçando os amigos, rindo feliz porque viu seu país ir para mais uma fase da Copa do Mundo.
Isso não se concretiza. Não se concretiza porque, na véspera, encontra um viaduto no meio do caminho. Não é uma pedra. Uma pedra já poderia ter feito um imenso estrago. Mas era um viaduto (!). Sabe quanto ele pesa? Você não imagina. São 2.500 toneladas. Isso tudo em cima de uma avenida, de carros, de gente, de vidas, de famílias, de felicidade, de uma cidade que estava feliz. Agora, como ser feliz de novo?
A vida segue. A gente tem de tentar. Sorrir com a cidade, acreditar que vai haver justiça. Que alguém vai responder pelo crime, crime mesmo, que te impediu de ver o gol bonito do David Luiz e a emoção do Thiago Silva. Ou o aperto que passamos depois do pênalti que o colombiano James Rodriguez converteu em gol.
Foi suado, sofrido. Mais sofrida está a vida da sua família, do seu pai, que chorou muito, que chora e vai chorar por toda a vida. Da sua filhinha, que não para de perguntar por você. Ela está preocupada. Como vai ser? Quem responde por isso? Quem vai amenizar essa dor e preencher o buraco infinito que vai existir na vida dela pela sua falta, pelas imagens que a memória de criança vai levar de uma forma meio obscura, mas sempre associada à dor? Quem vai estar com ela quando ela passar mal à noite, quando estiver adolescendo, dando seus primeiros passos para a vida adulta, se apaixonando pela primeira vez, passando no vestibular ou vibrando com o primeiro emprego?
O que quem pensa em dinheiro, dinheiro, dinheiro unicamente não vê é isso. Hanna é uma das vítimas da ganância, da falta de comprometimento mínimo. Hanna e Charlys, os dois mortos, esmagados pelo viaduto da Pedro 1º, pedimos desculpas pela vida que tiraram de vocês. Não podemos fazer muito, mas estamos tristes, profundamente tristes. Há um rasgo na cidade, um viaduto, que parou a vida de vocês e marcou a nossa para sempre.

domingo, 29 de junho de 2014

Anestesia

Se eu tive um coração.
Se ele está partido.
Se ele está pulsando.
Se tudo isso,
por hora, não lembro.
Graças, anestesia da minha vida momentânea.
Há uma bola em campo.
Há 22.
Há milhões de olho.
Olhando, não olho para cá.
Vá para frente.
Coração.
Há outra direção.