quinta-feira, 23 de junho de 2016

Se um rato, um ninho

Uma das primeiras vezes em que eu tive a audácia de desafiar minha brava mãe (brava na época, hoje ela é mansinha) foi quando eu tinha uns 12 para 13 anos. Com cabelão, como hoje, quis cortar. Minha mãe jamais iria permitir. Fui lá escondido e cortei "chanel". Não sei por qual motivo, já que Inês era morta, eu decidi jogar o cabelo fora, para esconder a prova do crime. Perto de casa mesmo, onde é o casarão mais antigo da cidade - transformado recentemente em unidade de educação infantil -, havia um lote vago atrás. Era ali. Respirei, juntei forças, girei o braço e atirei o mais longe que eu pude aquele rabo de cavalo, certa de que, assim, não seria punida pela desobediência.
(Lembro que cortei meu cabelo com uma senhora que atendia em um salão em casa, em um bairro ao lado do meu. No futuro, acabei me tornando cliente dela. Dona Conceição. Certo dia desse futuro hoje já passado, à tarde, quando bati a campainha para pedir corte mais uma vez, um adolescente mais jovem que eu atendeu. E me contou, então, que não haveria corte nunca mais. Dona Conceição havia falecido, de um jeito que a gente só sabe que existe, mas nunca crê de fato. Foi atropelada por uma bicicleta, bateu a cabeça no meio-fio, teve traumatismo craniano. Fiquei triste e voltei pra casa sem cortar o cabelo naquela tarde chuvosa. Eu gostava da dona Conceição. Era uma senhora de uns 45 a 50 anos, paciente, me dava conversa e sempre me atendia solicitamente.)
Quando joguei o cabelo no lote vago era noite. Foi um triunfo para mim. Mal sabia eu... O problema com minha mãe foi menos grave que o que eu imaginava que seria. Ela chamou a minha atenção, mas não bateu nem nada. Eu a desobedeci pouco tempo depois de novo, furando as orelhas. Só tomei outra advertência. Acho que minha mãe já estava começando a entrar na fase mais mansa dela quando eu decidi me "rebelar".
Bom, passado o aperto com a minha mãe, o que me atormentou dias e noites seguidos a partir daquele dia foi a conversa de não sei quem para mim quando soube que eu joguei o cabelo no lote vago. "Se um rato pegar o seu cabelo e fizer ninho, você vai ficar doida". Meu Deus, que tormento foram essas palavras. Quis ir atrás do cabelo, mas o que eu ia fazer com ele? Como ia entrar no lote? Qual seria o melhor horário? E se o rato já tivesse pegado? Acabei não indo atrás do cabelo, mas sofri muitos dias, não dormi direito e, acho, me deixei em estado de observação, para ver se havia ou não ficado doida. Talvez na primeira chuva eu tenha agradecido, poderia ter espalhado um pouco o cabelo. Se o cabelo estivesse espalhado, não deveria valer a tal profecia. Se fiquei doida ou não? Prefiro uma resposta menos maniqueísta. Ou: "estou em estado de observação".

Um comentário:

  1. Hehehe bons tempos, né?! Esse corte de cabelo tem boas histórias .. Depois nos dê o prazer de contar onde foi parar aquele outro pedaço de cabelo... Bjos

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